Um dos maiores medos dos fãs de The Handmaid's Tale era se a série poderia expandir com sucesso o mundo do livro de Margaret Atwood, o final da segunda temporada, com o episódio intitulado por “The Word” prova a notável medida em que é feito exatamente isso. Vários personagens em torno de June surgem em um momento decisivo, cada um dos quais foi constantemente desenvolvido ao longo de mais de doze horas de narrativa. É um trabalho além do material de origem, mas também sugere, ainda que ligeiramente, que a história de June se torna responsável pela narrativa.

O finale da temporada beira a perfeição, frequentemente fantástico, combinando uma cinematografia deslumbrante com um forte trabalho com personagens e abundância de suspense. Mas seu final, onde June sacrifica sua liberdade para lutar por Hannah é um ponto que nos deixa de coração partido. Mesmo isso nos afetando, a segunda temporada já forneceu uma versão deste ponto de plotagem várias vezes, ela precisa estar em Gilead para salvar Hannah. Moira e Luke escaparam, mas continuam sem poder algum no Canadá.

O episódio começa em Rita e June, vasculhando as coisas de Eden, lamentando seu destino e por que não fizeram mais para salvá-la. Parece que sua perda foi particularmente difícil para Rita. "Eu deveria ter tentado ajudá-la." Lamenta. June encontra a Bíblia de Eden e faz uma descoberta surpreendente: anotações íntimas de passagens, algumas das páginas quase ilegíveis por seus rabiscos. Com apenas quinze anos de idade, a observação cuidadosa de Eden não teria sido apenas proibida, mas considerada incrível, já que ela cresceu em um tempo e lugar onde as mulheres não podiam ler e escrever. June confia a descoberta à Serena e implora para que ela considere a transgressão de Eden de uma forma diferente da que foi imposta por Gilead. Mas Serena aceita. "Minha filha vai ser criada adequadamente", diz ela, depois de June perguntar como ela poderia manter Holly segura. 

Serena expulsa June da estufa de flores, mas, dado tudo o que ela passou nesta temporada, não podemos nos deixar levar por apenas isso, agora ela tem medo do futuro de Nichole. Inicialmente ela fica quieta. Mais tarde ela assiste em um doloroso silêncio o pai de Eden revelar quão distorcida é sua família: foi ele quem entregou Eden quando apareceu em casa com Isaac, uma filha jovem morta simplesmente por ter um caso. June, horrorizada, volta sua atenção para Fred quando o resto do grupo sai: "O que você vai fazer quando eles vierem pela sua filha?" Ele a repreende friamente: "Você é a miséria de todos os homens, todas vocês".

Depois de uma pequena reunião secreta das Esposas de Gilead, essencialmente julgando se outras esposas sentem a mesma preocupação, o que é claro que sentem, Serena decide que não pode ficar de braços cruzados. Ela leva uma proposta aos tomadores de decisão, os Comandantes, em companhia de um exército de Esposas atrás dela: permita que os filhos e filhas de Gilead leiam as escrituras. Olhando de trás da mesa solene, Fred parece envergonhado e enfurecido. E quando Serena começa a ler a Bíblia, com algumas Esposas saindo da sala como resultado, Fred chega a puni-la. Os guardas a levam embora, Serena volta para casa em silêncio pouco depois, com o dedo cruelmente removido. June se senta ao lado dela em solidariedade. Serena diz para ela, chorando: "Eu tentei."

Para June, isso é mais uma indicação da opressão inabalável de Gilead, não há manobras dentro de suas estruturas totalitárias. Ela está cada vez mais atraída por sua nova família, dizendo “Eu te amo” para Nick e aproveitando cada segundo que consegue passar com a bebê. Mas desde que ela esteja com Nick e a bebê na casa dos Waterford nada pode mudar. Fred perversamente oferece a ela mais visitas a Hannah, e uma chance de ficar em casa com Holly, se ela puder ser uma boa aia. A oferta desagradável a leva a entrar em outro sentimento de raiva.

Enquanto June está enfrentando mais do mesmo, Emily está em uma situação sem precedentes, vivendo com um Comandante mais imprevisível, cujas intenções são impossíveis de discernir. Caminhando com June e Janine enquanto eles discutem a execução brutal de Eden, Emily revela que é hora de sua primeira Cerimônia com Joseph. Emily diz a June que está feliz por ter voltado a andar com ela, mas quando a vemos de volta em sua nova casa, ela está inquieta. Sua tendência rebelde volta rapidamente: Em pânico, procura por uma faca e, senta-se junto à lareira, esperando que Joseph entre. No entanto, o novo Comandante responde positivamente às expectativas. “Não, levante-se. Não vou fazer isso com você. Vá para o seu quarto.”

A faca, apesar de não ter sido usada com Joseph, não foi pega em vão. Tia Lydia passa mais tarde para checar Emily, contando alegremente que Joseph disse que a Cerimônia correu bem e, em seguida, repreendeu-a por não apreciar a oportunidade de ter outra chance. Ela sai, Emily corre atrás dela e a apunhala nas costas, literalmente. É uma imagem em camadas, dado o quão intimamente Lydia percebe sua conexão com suas aias, será fascinante ver como isso acontece na terceira temporada. O produtor Bruce Miller confirmou que Lydia não está morta. É também um momento estranhamente triunfante para Emily. A atriz Alexis Bledel ganhou um Emmy por este papel na primeira temporada e esteve melhor do que nunca nestes dois últimos episódios. Como Emily corre para o banheiro, empolgada e fortalecida, finalmente esmagada pela realidade do que fez, é uma atuação fantástica.

Isso é uma reviravolta chocante dos eventos que, em retrospectiva, parecem narrativamente justificados. O arco de Emily nesta temporada começou definhando nas colônias e terminou com um retorno a Gilead, uma reintegração forçada no lugar que a isolou, mutilou e baniu. Ela recupera sua força neste final, em parte pelo entendimento de que está vivendo com o homem conhecido como arquiteto da economia de Gilead, um cara culpado. Depois que Emily esfaqueia Lydia, Joseph a leva para o andar de baixo e entra no carro dele; sua esposa acredita que ele está prestes a matar Emily, mas quando ele vai embora, tocando música em alto e bom som com Emily soluçando no banco de trás, está claro que outras coisas melhores virão. O carro de Joseph por si só já mostra que nada está normal, é diferente dos demais de Gilead.

A segunda mudança de perspectiva de personagem é de uma inesperada para muitos. June está pacificamente embalando Holly quando, depois de um minuto, ela vê fogo do lado de fora, do outro lado da rua. Rita aparece do nada: “Podemos tirar você daqui, você e a bebê. Mas temos que ir agora.” A promessa de aproveitar a personagem de Rita de forma inteligente nesta temporada foi cumprida, pessoalmente esperava a fuga dela, não de Emily, mas tudo foi como tinha que ser. É brilhante ver a evolução de Rita, ela era incapaz de conversar com June normalmente, agora ela está orgulhosamente chamando June de “durona” para Nick e se corroendo por não proteger melhor Eden. Neste final, vemos o culminar emocionante de sua transformação: Juntamente com uma rede secreta de Marthas, Rita criou um caminho para a liberdade de June. A última vez que vemos Rita é ela conversando com Fred, pouco depois de June sair; ela olha para ele, um silencioso reconhecimento de que finalmente se juntou à Resistência. Nick também se revela, ele para Fred com sua arma para não permitir que ele forme uma equipe de busca.

O que nos leva a terceira mudança de personagem, a de Serena. Ao longo da segunda temporada ela emergiu como a segunda protagonista da série. O elemento mais forte da temporada tem sido, de longe, a relação distorcida e profundamente ressentida estabelecida entre as duas mulheres, quando a gravidez de June se desenvolveu e depois que ela teve a bebê. Tudo vem à tona aqui. June está prestes a deixar a casa dos Waterford, já tendo abraçado Nick, quando Serena a pega e pede a bebê de volta. June tentou e fracassou tantas vezes para apelar para o senso de decência de Serena, seu amor pelo bem-estar da criança. E ela tenta novamente. "Eu posso tirá-la", diz June. "Você sabe que ela não pode crescer aqui." Serena reluta, mas sabe que June está certa. E finalmente deixa June e a bebê irem livres. A cena de despedida é devastadora, dado que não é realmente a bebê de Serena e que June é a herói dessa história. 

E assim ficamos com June e sua bebê. À medida que a fuga avança, é impressionante quão meticuloso e detalhado é realmente esse plano onde June vai de Martha em Martha, guiada pelas ruas, becos e gramados. A coisa toda acontece sem problemas. Quando June se aproxima de sair, ela não pode deixar de pensar na fuga inacabada ao ir sem Hannah. Ela conforta Holly enquanto espera para ser pega, e relembra de ter cantado baixinho para Hannah. Então o carro chega. June corre em direção a ele e, na virada mais surpreendente do episódio, ela não vê ninguém menos do que Emily e Joseph. Joseph é o ingrediente final do esquema, a fuga pode finalmente funcionar depois das tentativas anteriores. Aqui temos vontade de abraçar Joseph através da televisão, depois de uma bela trilha sonora no som do carro, um digno encontro entre Emily e June.

Outro carro para, Emily corre em direção a ela e entra, enquanto June fica para trás por um momento, contemplando. Então, um sorriso conhecido. Ela caminha na direção do carro, com a bebê na mão, e a entrega para Emily. "Chame-a de Nichole", diz June, referindo-se ao nome que Serena deu à criança em uma forma de homenageá-la. Ela fecha a porta e os observa ir embora.

É uma cena poderosa para terminar a temporada, é intrigante para June, quando ela entra na próxima fase da Resistência contra Gileade, enquanto cumpre sua promessa a Nichole de tirá-la de lá. Mas, claro, a decisão de June realmente leva a série de volta ao território familiar. Enquanto tantos personagens ganham vida no episódio, aquecendo o enredo e abrindo novos caminhos para serem explorados, o que vem a seguir para Emily e Nichole, como Joseph se encaixa em uma sofisticada rede oculta, o que acontecerá com Serena agora que Nichole se foi, tudo leva June a seu longo e difícil caminho para a liberdade total. E é profundamente frustrante, dada a quantidade de loops que compõe esse caminho. Na segunda temporada, The Handmaid’s Tale provou que pode crescer e ir mais longe, oferecer esperança para um mundo que muitas vezes poderia parecer tão sem esperança. Apesar disso, ao terminar com June quase de volta à estaca zero, lembrou-nos de quem é essa história - mesmo que ela esteja se tornando mais uma responsabilidade narrativa do que uma força.

Texto escrito para The Handmaid's Tale Brasil, reviews sempre as quartas, mesmo dia da entrada do episódio no catálogo do Hulu. Então, você percebeu algo que não está esclarecido aqui nessa review? Tem algo a acrescentar? Comente abaixo sua opinião sobre o episódio.