The Handmaid's Tale vinha construindo uma questão central desde a primeira temporada: como June teria sua vingança? Os olhares sombrios se intensificaram nos episódios mais recentes, ainda mais depois de June ter ultrapassado a fronteira. As regras do universo de Margaret Atwood foram distorcidas para dar a June - e, presumivelmente, a muitos espectadores - um veredito vingativo.

Me pergunto se devíamos nos sentir bem, ou até exultantes, ao ver Fred Waterford encolhido no chão levando socos e pontapés de todos os lados. Estavam June e suas companheiras, dando ao Comandante o tipo de final que ele projetou e aprovou para tantos outros em Gilead. A simetria lindamente projetada: as ex-aias e até mesmo ex-Marthas dispostas em um círculo ao redor dele, assim como foram treinadas para fazer quando eram mandadas a apedrejar e matar alguém de sua própria espécie. Elas voltaram as táticas do sistema contra ele. Pode até ser "recompensador", como o elenco tanto descreveu esse episódio final. Mas essa vingança - violenta e sangrenta - é o melhor resultado possível que podemos imaginar para as vítimas? Eu não estou na pele delas, e muito menos na cabeça.

Legalmente, June esgotou todas as suas opções no Canadá. Em mais uma cena de carão de Moss na frente de um prédio jurídico, ela sabe que sua declaração é quase nada. Ninguém vai se importar. Nenhum juiz vai descartar o acordo com Waterford só porque June ainda está traumatizada. Ela não está errada quando explica a Moira e Rita que a Corte Internacional de Crimes se preocupa mais com o que sua nova fonte pode trazer a eles do que com o horror que ele causou no passado. Moira acredita que uma viagem à Suíça para falar na audiência final ou algumas notícias na mídia vão reverter o caso. Mas June - com razão - vê que Canadá e Gilead estão igualmente fixados em suas próprias agendas.

June está sentada do lado de fora do prédio de Tuello, apenas esperando ele terminar a corrida, ela tem um plano. Um plano ousado. Tuello aceita, mesmo que apenas por um momento, a série tenha colocado no caminho de June esse personagem que não iria ceder às suas exigências só porque ela é, como diz Moira, "A porra da June Osborne". Tuello é o outro lado da moeda - um empresário dedicado ao Estado de Direito e ao governo dos Estados Unidos no exílio. Se o sistema jurídico não produz um resultado justo, ele lamenta, mas é preciso aceitá-lo.

Serena quer ainda mais regalias na prisão, se é que o quarto confortável no Canadá possa ser chamado de prisão. No momento em que Fred se volta contra Gilead, ela sente que eles estão em vantagem, daí o direito de reclamar a Tuello. Chame-o de Comandante! Mude o tom daquela interrogadora! Internet mais rápida! Uma casa!

Serena é a corretora de poder do casal. Ela arruma o material de leitura para o voo transatlântico de Fred. Mas enquanto ela exteriormente insiste que ela e Fred vão viver juntos como uma família quando eles forem soltos, há sinais de que ela ainda hesita em se comprometer novamente com Fred. Ela dá um beijo de despedida nele ou oferece algum amor? Não. Ela vai fazer uma chamada via Zoom com Fred enquanto ele estiver fora? Poderia. Mas tenho certeza que não mais. Aliás, matar Fred e manter Serena viva é válido, considerando o quanto os homens caíram no esquecimento na narrativa dessa temporada. June foi cuspir na cara de Serena primeiro, como assim???

Por falar em questionamentos, desde quando a passagem na fronteira ficou tão fácil? A embaixada atrai facilmente Lawrence para um encontro com June por meio de outra ligação. Os dois marcam um encontro casual. Lawrence recuperou de forma vertiginosa o poder dentro de Gilead, passando de homem preso por traição a oferecer 22 mulheres por um Comandante que já cantou sua doce canção para as autoridades canadenses. Por que Gilead iria querer Fred Waterford de volta a essa altura? Só para matá-lo? Não parece muito válido.

O que June queria daquela última visita a Waterford na prisão? Ela o estava apaziguando da mesma forma que fazia em Jezebels ou nas jogatinas de Scrabble. June se extingue como uma possível ameaça para ele, embora às vezes parecia que ela estava prestes a envenenar seu uísque, ou espancá-lo com a Bíblia ou com o copo. Ao invés de violência de cara, June leva o Antigo Testamento a sério. "O justo se alegrará quando vir a vingança e lavará os seus pés no sangue do ímpio", Emily diz a ela. Salmo 58. Uma profecia.

Os momentos antes do grupo de mulheres descerem sobre Fred como lobos sobre a caça são muito mais aterrorizantes do que a violência em si. Menos a mordida de June, que foi bem feia de se ver. Apesar de tudo, essa é a vontade de June. Ela quer que Fred sinta o que ela sentiu, corra na floresta por sua vida, antes que as feras caiam sobre você ao som de "You Don't Own Me" de Lesley Gore e levem embora sua vida e a de seu filho. Aliás, ótima escolha de música para relembrar os momentos da primeira temporada bem encaixados em flashbacks.

O corpo sem vida pendurado em uma parede desmoronada na Terra de Ninguém basta? Nolite te bastarde carborundorum! Elas mandam o dedo e a aliança para Serena como uma pequena provocação, certamente em referência a ela ter tido seu dedo cortado por culpa de Fred. Infelizmente não pudemos ver a reação de Serena a isso, já que o agente da prisão abre o pacote antes de entregá-lo à destinatária.

Assistir June caminhando de volta pela floresta com sangue no rosto, observando aquela mancha de sangue na sua filha, não começou uma revolução ou derrubou a teocracia, e muito menos ajudou as mulheres que continuam a sofrer em Gilead. Isso pode apenas dar a June um alívio temporário. É suficiente? Ela precisa de terapia, urgente! Quando Luke a encontra com Nichole, e imediatamente percebe o que ela fez, ela pede cinco minutos e então diz que vai embora. Ela está se entregando? Fugindo? Matar Fred Waterford valeria o custo de deixar sua filha e amigos novamente, tão cedo?

Como episódio final favorito eu fico com o da terceira temporada, certamente. "The Wilderness" foi um ótimo episódio da série, mas pesadíssimo como final. São tantas perguntas que nos permeiam agora, o que vem a seguir? The Handmaid's Tale foi renovada ainda em 2020 para a quinta temporada, que não deve ser a última da série. O Hulu comprou os direitos de Os Testamentos, então nossas aventuras em Gilead não chegam ao fim tão cedo. Até a próxima!

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